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sexta-feira, 15 de maio de 2015

um pouco de Clarice...


(lugar onde li os livros de Clarice)



Olhei para minha pequena estante de livros onde guardo meus queridos (que não venderia por preço algum) e meus olhos caíram no volume de Clarice Lispector, Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres, que já li há muito anos. Folheando as páginas já meio amarelecidas e com o perfume dos livros antigos, deparei-me com trechos marcados a lápis, das frases que na época produziram algum impacto em mim. Transcrevo abaixo, talvez alguém goste de recordar Clarice...

NOTA: ESTE LIVRO se pediu uma liberdade maior que tive medo de dar. Ele está muito acima de mim. Humildemente tentei escrevê-lo. Eu sou mais forte do que eu. C.L.

pág.19 - ...seu descompasso com o mundo chegava a ser cômico de tão grande: não conseguira acertar o passo com as coisas ao seu redor. Já tentara se pôr a par do mundo e tornara-se apenas engraçado: uma das pernas sempre curtas demais.

pág.31 - Lori tinha medo de cair no abismo e segurava-se numa das mãos de Ulisses enquanto a outra mão de Ulisses empurrava-a para o abismo - em breve ela teria que soltar a mão menos forte do que a que a empurrava, e cair, a vida não é de se brincar porque em pleno dia se morre.

pág.35 - Por mais intransmissível que fossem os humanos, eles sempre tentavam se comunicar através de gestos, de gaguejos, de palavras mal ditas e malditas. (aí fiquei na dúvida se houve erro de concordância com a palavra "intransmissível", ou falha da revisão).

pág.40 - Só com Ulisses viera aprender que não se podia cortar a dor - senão se sofreria o tempo todo.

pág.42 - Ela se guardava. Por que e para que? Para o que estava ela se poupando? Era um certo medo da própria capacidade, pequena ou grande, talvez por não conhecer os próprios limites. Os limites de um humano eram divinos?

pág.49 - Mas olhe para todos ao seu redor e veja o que temos feito de nós e a isso considerado vitória nossa de cada dia. Não temos amado, acima de todas as coisas.

pág.55 - Era mais ou menos isto: é só quando esquecemo todos os nossos conhecimentos é que começamos a saber.

pág.58 - alivia a minha alma; faze com que eu sinta que Tua mão está dada à minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já estamos na eternidade, faze com que eu sinta que amar é não morrer, que a entrega de si mesmo não significa a morte, faze com que eu não Te indague demais, porque a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta, faze com que me lembre de que também não há explicação porque um filho quer o beijo de sua mãe e no entanto ele quer e no entanto o beijo é perfeito, faze com que eu receba o mundo sem receio, pois para esse mundo incompreensível eu fui criada e eu mesma também incompreensível, então é que há uma conexão entre esse mistério do mundo e o nosso, mas essa conexão não é clara para nós enquanto quisermos entendê-la, abençoa-me para que eu viva com alegria o pão que eu como, o sono que durmo, faze com que eu tenha caridade por mim mesma pois senão não poderei sentir que Deus me amou, faze com que eu perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja mão humana amada para apertar a minha, amém. (nota: na pág. 125 há a mesma oração porém com algumas modificações no texto).

pág.65 - Temia que Ulisses se cansasse daquela sua resistência paquidérmica em deixar o mundo entrar nela, e desistisse. E o desespero a tomava.

pág.72 - Surpreende seu próprio pensamento: então ela planejava de fato um dia ser sua? Pois enganava-se sempre pensando que se tratava de uma espécie estranha de amizade e que assim continuaria sempre, até murchar como uma fruta que não é colhida a tempo e cai apodrecida da árvore para o chão.

pág.: 75 - Não é por nada que olho: é que eu gosto de ver as pessoas sendo.

pág.115 -  Ela conhecia o mundo dos que estão tão sofridamente à cata de prazeres e que não sabiam esperar que eles viessem sozinhos. E era tão trágico: bastava olhar numa boate, à meia-luz, os outros: era a busca do prazer que não vinha sozinho e de si mesmo.

antes o sofrimento legítimo que o prazer forçado.

pág.119 - pois com os amantes que tivera ela como que apenas emprestava o seu corpo a si própria para o prazer, era só isso, e mais nada.

E pensar que os filhos do mundo crescem e se tornam homens e mulheres, e que a noite será plena e grossa para eles também, enquanto eu estarei morta, plena também. 

pág.132 - Que faria dessa lucidez? Sabia também que aquela sua clareza podia se tornar o inferno humano. Pois sabia que - em termos de nossa diária e permanente acomodação resignada à irrealidade - essa clareza de realidade era um risco: "Apagai pois a minha flama, Deus, porque ela não me serve para os dias. Ajudai-me de novo a consistir de um modo mais possível. Eu consisto, eu consisto."

pág. 133 - Pelos minutos de alegria por que passara, Lóri soube que a pessoa devia deixar-se inundar pela alegria aos poucos - pois era vida nascendo. E quem não tivesse força de ter prazer, que antes cobrisse cada nervo com uma película protetora,com uma película de morte para poder tolerar o grande da vida.

pág.135 - E Lóri pensou que talvez essa fosse uma das experiências humanas e animais mais importantes: a de pedir mudamente socorro e mudamente esse socorro ser dado.

pág.161 -  - A noite de hoje está m parecendo um sonho.
                  - Mas não é. É que a realidade é inacreditável.

pág.169 - Existir é tão completamente fora do comum que se a consciência de existir demorasse mais de alguns segundos, nós enlouqueceríamos. A solução para esse absurdo que se chama "eu existo", a solução é amar um outro ser que, este, nós compreendemos que exista.
                  



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